30.9.11

subtil & subtil

ele tem um renault cinco bege e insiste em mantê-lo apesar de todos os contras. também tem uma daquelas casas de paredes bege, móveis de cerejeira e candeeiros dourados. é uma casa de silêncios e algum rádio. nela nunca se nota se é verão se é inverno porque as cortinas estão sempre corridas e a água corre sempre na mesma quantidade. cheira muitas vezes a leite fervido e naftalina e nada mais que as memórias recuperem. parece tudo vazio menos uma prateleira com livros e um cesto com pêras desta época. e acho que tem mulher ou teve porque tem uma filha. sorte a dela que cresceu mais do que ele, mas quase adulta ainda anda de mochila. discutem todos os dias porque ela anda sempre na linha mas só usa a mochila num dos ombros e isso deixa-o nervoso. de resto nada a apontar. 
à sexta é dia certo de cinema. vão os dois mais ou menos contentes, no supercinco bege em que ninguém repara. ele enterrado no lugar do condutor e ela cansada do equilibrismo. no entanto fazem o caminho todo a falar e entendem-se bem, apesar daquilo da mochila. por infortúnio, onde vivem já só há cinema onde há jumbo e neste caso uma coisa implica a outra mas não obriga ainda. nesse dia por precaução insistem é em vestir mais camadas de cinzento para contrariar o excesso de luz e cores até à grande tela.


é verdade que têm manias. mas é da maneira que ninguém suspeita que neles se esconde uma dupla de heróis com descanso semanal diante das vidas planas dos outros.


1 comentário:

  1. Até dói, de tão lindo...
    Um dos mais comoventes textos, este!

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.