lara dói

viu-se com dores durante duas semanas. umas dores variadas e espalhadas pelo corpo, que às vezes se soltavam pela garganta e caíam no parquê que lara tinha acabado de mandar colocar, por causa das alergias à carpete pejada de memórias em partículas e ácaros com perninhas.

a lara dói doíam-lhe sítios estranhos e presunçosos e por causa disso coleccionava raios-xis que mandava emoldurar.

desta última, teve dificuldade em aguentar mais uma semana para que não restassem dúvidas nem apenas feixes de dores, e foi às urgências enquanto a isenção é temporária. lá foi lara, cansada de dores e de dores de arrasto pois as que não cabiam no corpo, levava-as ensacadas, para onde vertia as lágrimas que não conseguia segurar.

ali esteve nove horas de pulseira ao pulso. uma para ver como um médico masca um pastilha elástica de bata, duas para raio-xis e análises, cinco para observação sem vista e uma-final para que lhe dessem a receita.

ainda assim, saiu com dores e assim se manteve por mais uma semana, até que arriscou trocar-lhes as voltas, fazer de conta que não as tinha e arrancar para segunda-feira, em estrada de paralelos. azarada, uma dor de trás, caiu-lhe ao chão. entalou-se entre os paralelos e lara gritou de goelas à banda. 

o médico da chiclete não autoriza que lara saia dali, naquelas circunstâncias. e que por isso, terá de aguardar que com ela, a dor entre em fase minguante, muito agarradas à lua.