21.1.12

amélia cruz


no internamento não gostava de desmanchar as camas acabadas de fazer e por isso esperava que as horas se abatessem sobre as colchas e lhes imprimissem a flacidez do tempo. depois então, deitava-se de qualquer maneira enquanto as outras dispunham os cestos para as ninas e as laicas dos seus mundos e faziam circular fotografias de maridos malfadados e outros mais dotados. 
era um quarto de seis camas, lençóis pelo chão e pastéis escondidos, onde amélia misturava as histórias de todas e deixava-se levar pelo sono enquanto depositava os olhos na boca escancarada do lado com sonhos de pelúcia
já de manhã, penteavam-se o mais que podiam diante da aparição médica. e ainda que amélia não quisesse ir já embora, queria sentir, ao menos, o bolo de possibilidades ali onde o esófago se abre ao estômago depois do café da manhã. e quando o médico lhe dizia que talvez só dali a dois dias, então ela caía para trás em câmara lenta enquanto a outra de plumas embeiçava olhos e lábios e a da ponta falava mais depressa e tanto, que se deslocava pela trepidação que as palavras provocavam naquele corpo franzino de mulher interrompida.
ali as noites eram sempre longas. e  quando já todas dormiam, três raparigas cantavam com as bocas cravadas nas orelhas de amélia, noite dentro e até que as vanguardas dessem três voltas de avanço a cantar sem vergonha para o dia se fazer importante.




ao que se sabe, amélia cruz teve hoje alta e insiste em atirar as raparigas ao ar de tão feliz. é que para todos os seus efeitos, o ano novo começa agora e a de plumas até apareceu para dançar.




à menina limão que nos deu as preferidas.



2 comentários:

  1. Vim hoje à procura deste texto. Alguma coisa se passou para eu não ter comentado. Devo ter ficado empancada de novo nas preferidas, antes de me apagar.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. :) não sabia como avisar mas também não podia adiar. mesmo que core de todo.

      Eliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.