19.11.11

olinda máxima


fazia tudo por revista. quando decidia cortar o cabelo, não era de qualquer maneira. descoberto o modelo, recortava-o em rectângulo e dirigia-se ao cabeleireiro mais próximo com o recorte em riste. quem a visse sabia que nunca ficava igual mas para ela era exactamente assim. 
mais, mobilou a casa com todos os móveis que encontrou em anúncios de revista. e com o tempo, até o dono da casa de móveis que a fornecia, achou que era melhor assim.
aprendeu a cozinhar com as receitas recortadas das revistas e nunca se aventurou com listas nas compras para o dia-a-dia. acautelava-se com compilações da selecção semanal de receitas recortadas e com elas orientava-se bem e nunca gastava demais.
com o carro procedeu de igual modo, e sabia-se que o homem do stand ficou muito aliviado por olinda não ter insistido mais na paisagem montanhosa que vinha com o carro no recorte muito estimado.
já com a roupa foi algo que se resolveu mais ou menos bem com o empenho de uma costureira que conheceu numa ocasião de alguma tensão na loja de confecções do costume mas agora franchisada.
lembra-se até que no início da sua vida de solteira emancipada, decidiu que não havia casa-nossa sem álbuns nem fotografias de família. e como também a esse respeito a família se manteve distante, optou por reforçar as capas às revistas cor-de-rosa e às que não se aproveitavam, recortar os retratos mais invejados, emoldurá-los e dar olhos às paredes. foi também por essa altura que recortou os dois bebés mais bonitos que encontrou e guardou-os com cuidado e sempre na bolsinha da carteira.
os anos passaram e a vida foi-se fazendo de recortes. uns de papel, outros de verdade
até que engravidou de recorte apertado contra o peito e dessa vez escapou. engravidou a segunda, de recorte suado na mão mas dessa não passou. 


 convencida de que se enganou na edição, está a fazer onze anos que desfolha revistas à procura do bebé conforme.



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